segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A palavra mágica


Então fica assim: como a palavra francesa Reveillon vem do verbo réveiller, que significa Despertar, espero que em 2013 possamos despertar para novos tempos. Com luz, esperança, leveza e generosidade. E já que estamos falando em palavra, deixo manifesto o meu respeito ao poder da palavra, essa que é minha ferramenta de trabalho, meu bálsamo, minha luz e meu norte. Por isso, prestarei atenção a ela e a cultivarei da melhor maneira possível, com a melhor das intenções. Essa é a minha promessa de Ano Novo. Por isso também, coloco aqui esse poema de Drummond. Que as palavras sejam mágicas para todos nós em 2013. 

A palavra mágica
Certa palavra dorme na sombra 
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura ficará sendo
minha palavra.

Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Para o tempo que passa, e nós que o vemos passar


Esta história, escrita por Mem Fox, é simplesmente maravilhosa e acredito que se encaixe bem esta semana, já que está no ar a reflexão de todos nós sobre a passagem do ano e a maneira como o tempo passa rápido e escorrega de nossas vidas. É também para refletirmos sobre o doar-se, o amar-se através de coisas simples.

GUILHERME AUGUSTO ARAÚJO FERNANDES
Era uma vez um menino chamado Guilherme Augusto Araújo Fernandes e ele nem era tão velho assim.
Sua casa era ao lado de um asilo de velhos e ele conhecia todo mundo que vivia lá.
Ele gostava da Sra. Silvano, que tocava piano.
Ele ouvia as histórias arrepiantes, que lhe contava o Sr. Cervantes.
Ele brincava com o Sr. Valdemar, que adorava remar.
Ajudava a Sra. Mandala, que andava com uma bengala.
E admirava o Sr. Possante, que tinha voz de gigante.
Mas a pessoa que ele mais gostava era a Sra. Antônia Maria Diniz Cordeiro, porque ela também tinha quatro nomes, como ele.
Ele a chamava de Dona Antônia e contava-lhe todos os seus segredos.
Um dia, Guilherme Augusto escutou sua mãe e seu pai conversando sobre Dona Antônia.
- Coitada da velhinha - disse sua mãe.
- Por que ela é coitada? - perguntou Guilherme Augusto.
- Porque ela perdeu a memória - respondeu seu pai.
- Também, não é para menos – disse a mãe. - ela já tem noventa e seis anos.
- O que é memória? - perguntou Guilherme Augusto.
Ele vivia fazendo perguntas.
- É algo de que você se lembre - respondeu o pai.
Mas Guilherme Augusto queria saber mais; então, ele procurou a Sra. Silvano que tocava piano.
- O que é memória? - perguntou.
- Algo quente, meu filho, algo quente.
Ele procurou o Sr. Cervantes, que lhe contava histórias arrepiantes.
- O que é memória? - perguntou.
- Algo bem antigo, meu caro, algo bem antigo.
Ele procurou o Sr. Valdemar, que adorava remar.
- O que é memória? - perguntou.
- Algo que o faz chorar, meu menino, algo que o faz chorar.
Ele procurou a Sra. Mandala, que andava com uma bengala.
- O que é memória? - perguntou.
- Algo que o faz rir, meu querido, algo que o faz rir.
Ele procurou o Sr. Possante, que tinha voz de gigante.
- O que é memória? - perguntou.
- Algo que vale ouro, meu jovem, algo que vale ouro.
Então Guilherme Augusto voltou para casa, para procurar memórias para Dona Antônia, já que ela havia perdido as suas.
Ele procurou uma antiga caixa de sapatos cheia de conchas, guardadas há muito tempo, e colocou-as com cuidado numa cesta.
Ele achou a marionete, que sempre fizera todo mundo rir, e colocou-a na cesta também.
Ele lembrou-se, com tristeza, da medalha que seu avô lhe tinha dado e colocou-a delicadamente ao lado das conchas.
Depois achou sua bola de futebol, que para ele valia ouro; por fim, entrou no galinheiro e pegou um ovo fresquinho, ainda quente, debaixo da galinha.
Aí, Guilherme Augusto foi visitar Dona Antônia e deu a ela, uma por uma, cada coisa de sua cesta.
"Que criança adorável que me traz essas coisas maravilhosas", pensou Dona Antônia.
E então ela começou a se lembrar.
Ela segurou o ovo ainda quente e contou a Guilherme Augusto sobre um ovinho azul, todo pintado, que havia encontrado uma vez, dentro de um ninho, no jardim da casa de sua tia.
Ela encostou uma das conchas em seu ouvido e lembrou da vez que tinha ido à praia de bonde, há muito tempo, e como sentira calor com suas botas de amarrar.
Ela pegou a medalha e lembrou, com tristeza, de seu irmão mais velho, que havia ido para guerra e que nunca voltou.
Ela sorriu para a marionete e lembrou da vez em que mostrara uma para sua irmãzinha, que rira às gargalhadas, com a boca cheia de mingau.
Ela jogou a bola de futebol para Guilherme Augusto e lembrou do dia em que se conheceram e de todos os segredos que haviam compartilhado.
E os dois sorriram e sorriram, pois toda a memória perdida de Dona Antônia tinha sido encontrada, por um menino que nem era tão velho assim.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Feliz Natal!

Pensei em postar aqui um belo conto de Natal. Mas tenho estado a semana toda com esse poema na cabeça. Assim, é com ele que desejo a todos os meus amigos os meus votos do mais encantado Natal e o mais promissor ano novo !


Para ser grande, sê inteiro:
Nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
 Põe quanto és no mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda brilha,
Porque alta vive.

Fernando Pessoa

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Sarau de encerramento - muita história para contar

Ter a sensação de trabalho bem feito já é uma coisa fantástica. Mais fantástico ainda é saber-se reconhecida por seus alunos. Foi isso que senti no sarau de encerramento do curso O Professor que conta histórias, que dei no Senac. Uma das alunas, Tábata Vieira, produziu esse vídeo e me deixou profundamente emocionada. Com bom humor, sensibilidade, talento e carinho, ela contou a bela história tecida por todos nós durante o curso. E conseguiu fazer com que ele se tornasse inesquecível para todos nós. Por isso, agradeço profundamente à Tábata e a todos os alunos que estiveram comigo durante esses dias maravilhosos. Obrigada, pessoal. Nossa história se cruzou e uma marca linda ficou. E foi assim que essa história chegou ao fim (que, ao meu ver, pode estar também apenas começando). Beijo a todos.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Porque os contadores de histórias têm boa memória

Adoro dar cursos de contação de histórias. Sempre conheço pessoas maravilhosas, descubro novas amizades, aprendo novas histórias e faço uma troca maravilhosa de saberes e viveres. No curso que terminou na semana passada no Senac não foi diferente. Histórias lindas contadas por pessoas lindas. Muita diversão e muita emoção também. Um círculo de amizade se estabeleceu que, com certeza, dará muitos frutos. Sinto-me muito grata por ter tido a oportunidade de conhecer Luiz, Cintia Cesar, Cintia Rocha, Tuani, Débora, Stella, Luciana, Zeza Lima, Camila, Graciela, Gisele, Cidinha, Nana Augusta e Tábata. E, como faço, sempre, lhes entreguei uma história. Uma que fala dos primórdios da arte de contar histórias - um conto da tradição oral africana, que nos traz a singeleza e também a força do universo simbólico da África Ocidental. Puro encantamento, que reproduzo abaixo.   É conhecida pelo título acima e também pelo nome de O Marabu escrivão.

       Conta-se que na África Ocidental não havia histórias. E, por isso, não havia também sabedoria. O mundo era muito triste. Assim, o primeiro contador de histórias foi também um buscador de histórias, que saiu pelo mundo afora acompanhado de um pássaro-escrivão: o marabu.  Esse é o único pássaro que sabe qual das penas do seu traseiro deve ser arrancada para que, com ela, se possa escrever – o que faz dele um pássaro especial.  Andaram pelo mato afora, pelas savanas e ao longo dos rios para escutar os ventos, as pedras, as águas, as árvores e os animais. E encontraram muitas pessoas até então desconhecidas, que iam lhe contando as suas histórias.

     Munido da pena arrancada de seu traseiro e utilizando uma tinta feita de água, pó de carvão e goma arábica, o marabu-escrivão anotava cuidadosamente todas as histórias que escutava. E o buscador e contador de histórias caminhava e pensava “não vou conseguir me lembrar de todas essas histórias”. Mas o marabu continuava a ouvir e a escrever.
     Quando, depois de muito tempo, voltaram para casa, o buscador de histórias obteve a solução para aquilo que o preocupava. Seguindo o conselho do marabu, encheu de água uma grande cabaça e nela mergulhou todas as histórias escritas.  Durante toda a noite, naquela cabaça – que na África  chama-se canari – as palavras escritas com tinta se dissolveram na água. No dia seguinte, o marabu mandou que o contador de histórias bebesse todo o conteúdo daquela canari.
     Assim, todas as histórias bebidas tornaram-se histórias sabidas.
     E se você, por acaso, precisar beber uma história, escute o meu conselho: beba tudo. Não deixe nada no fundo do copo, porque isso poderia provocar um branco na sua memória. 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

2012 foi o ano do Dragão. Eita ano agitado este ! Para mim, foi um ano em que precisei tomar decisões importantes em minha vida, ano de perdas dolorosas, mas também de muitas descobertas. Ano de muito choro e muito riso. E um privilégio: ver meus livros sendo editados um a um. Então, para encerrar o Ano do Dragão, nada melhor do que receber quentinho do forno "O Dragão e a parede que brilhava", meu mais novo livro, pelo qual estou realmente encantada. O lançamento é no próximo dia 14, vejam o convite aqui. Espero todos lá!