quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Ter vontade e correr atrás

Ter coragem para correr atrás de seus sonhos.  Entender suas vontades e perceber o quanto elas importam para sua vida, sua alma.  Sentir uma coceira, que pode ser o que falta para transformar a sua vida (e coçar gostoso até doer). Eita coisa difícil... Já tive um monte de vontades, algumas delas eu respeitei, corri atrás. Não foi fácil, mas foi tão bom ...  E já tive um monte de exemplos também.  Dentro de casa mesmo, me deparei com filhas que deixaram o conforto e o aconchego da família para buscar seus sonhos, suas aventuras, seus ideais e até suas dúvidas em lugares bem distantes.  E também foi bom, até onde eu sei.  Sendo assim, sinto-me muito feliz em postar a história de hoje, de Jonas Ribeiro, lindamente ilustrada por Laura Michell e publicada pela Editora Callis. Acredito que ela seja uma homenagem para quem já sentiu vontade e foi atrás. Serve também para cutucar quem está morrendo de desejo, mas  prefere ficar sentado, esperando essa coceira/vontade passar.

O esconderijo das vontades

Era uma vez uma cidade onde moravam muitas vontades. Elas nasciam em um lugar escuro e silencioso e viviam por meses, anos, dentro das pessoas. Mas nem sempre as pessoas se davam conta de que havia uma vontade vivendo em algum canto de seu coração ou em alguma gaveta de seu pensamento. Quando a vontade percebia que não seria mesmo descoberta, ela deixava o esconderijo e voava para outro lugar do Universo. Ou, então, escolhia outra pessoa para nela se esconder. E, de preferência, uma pessoa que não estivesse tão ocupada assim e gostasse de olhar para dentro de si. 

Ah, e como as vontades eram sonhadoras! Sonhavam com a luz, com uma vida ruidosa. Queriam ser descobertas e crescer, crescer, só para conseguir saltar de seus esconderijos.

Nessa cidade, o padeiro sentia vontade de fazer pães mais macios e apetitosos. 
A costureira sentia vontade de estudar moda em Paris. 
O piloto de avião sentia vontade de ser astronauta. 
A telefonista sentia vontade de ser locutora de rádio. 
O pianista sentia vontade de tocar com uma orquestra. 
A bióloga sentia vontade de morar na Amazônia.

Os moradores da cidade gostavam de suas profissões, mas sentiam vontade de fazer algo mais. Não havia graça em só fazer o que sabiam. Eles queriam mais, muito mais. 
E, todos os dias, o Sol se levantava e animava as vontades a sair de seus esconderijos. 
E, todas as noites, a Lua se levantava e convidava as vontades a sair de seus esconderijos. 
Acontece que, mesmo escondidas lá dentro, as vontades ouviam chamar seus nomes. 
Elas queriam sair para brincar e descobrir o mundo. 

Conforme o tempo foi passando, as pessoas mais corajosas embalavam suas vontades e lhes contava que o mundo era um lugar bom. 
Conversavam um pouquinho por dia com elas. 
As pessoas corajosas davam tanta atenção para as suas vontades, que elas cresciam fortes e barulhentas.

Acontecia o que devia mesmo acontecer. As vontades já não cabiam nos esconderijos. Nada mais poderia contê-las. 
Era chegado o momento. 
As vontades fechavam os olhos, contavam até três e saltavam...

E, assim, o padeiro fazia pães mais macios e apetitosos.
A costureira virava modista.
O piloto de avião virava astronauta.
A telefonista virava locutora de rádio.
O pianista tocava em uma orquestra.
A bióloga morava na Amazônia.


Sim, era uma cidade onde as vontades adoravam crescer dentro das pessoas corajosas. 

2 comentários:

Giovanna Artigiani disse...

Adélia Prado dizia assim "Não quero faca nem queijo, eu quero a fome".Linda história que enche de esperança nosso cotidiano e faz surgir um certo brilho nos olhos.

Vanessa disse...

Sim, Giovanna. Nada como Adélia Prado como uma metáfora para nossos desejos. Obrigada.